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Lei em Campo

Torcedores do Inter podem processar o Palmeiras por visão prejudicada

Andrei Kampff

11/07/2019 17h10

O torcedor precisa ser respeitado. Sempre.

Ele é consumidor do esporte e tem direitos legais garantidos pelo Estatuto do Torcedor. Na nossa legislação ele é equiparado ao consumidor, com todas as garantias estabelecidas também pelo Código de Defesa do Consumidor.

A qualidade do serviço prestado também tem que ser respeitada. Quando se vai a um estádio, ninguém imagina ter que assistir a um jogo tendo uma tela na sua frente. Ainda mais quando essa tela só é colocada para a torcida visitante. Ou seja, torcedor do clube tem uma visão melhor da partida do que torcedor visitante.

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Se você comprasse ingresso para um jogo na casa do time adversário e colocassem uma tela na sua frente, só na sua frente, o que você acharia? Claro que não iria gostar. Claro que não.

Foi o que aconteceu com o torcedor do Internacional. Ele foi prejudicado e recebeu tratamento diferente do torcedor do Palmeiras no jogo pela Copa do Brasil.

E isso não está de acordo com o que diz a lei. O clube paulista pode ser responsabilizado pelo prejuízo que causa a quem compra um ingresso e assiste ao jogo no espaço da torcida visitante. Me parece justo.

É também é o que entendem os especialistas ouvidos pelo Thiago Braga.


 

A derrota por 1 a 0 para o Palmeiras pelas quartas de final da Copa do Brasil não foi o único dissabor que os torcedores do Internacional tiveram na noite da quarta-feira (10). Quem pagou R$ 120 para poder assistir ao jogo reclamou das condições de visibilidade no setor de visitante da arena palmeirense.

"Não é proibido ter proteção. Mas ela não pode prejudicar de modo significativo a visão. O Código de Defesa do Consumidor fala que produto ou serviço tem que ser adequado. Se a rede prejudica a visão do torcedor, evidentemente que há um prejuízo. Cabe até uma ação coletiva para mudar ou tirar a rede", analisa o advogado Caio Medauar.

Procurado pelo Lei em Campo, o Palmeiras afirmou que a rede existe em todos os jogos com torcida visitante no Allianz Parque e é uma exigência da Polícia Militar, que consta no laudo de segurança do estádio, para evitar que objetos sejam arremessados no campo ou no andar de baixo das arquibancadas.

Isso evitaria uma briga entre torcidas que poderia começar a partir do arremesso de objetos. Esse modelo de proteção passou a ser utilizado após a reclamação com as placas de acrílico que existiam no local até 2017 e também dificultavam a visão dos torcedores visitantes, especialmente em dias ensolarados.

"O Estatuto do Torcedor prevê que o torcedor tenha direito a assistir ao jogo em segurança, mas aí tem uma diferença entre a qualidade do serviço que está sendo prestado versus a segurança. O torcedor é um consumidor que tem direito ao espetáculo, com boa visibilidade. E aí tem uma falha: a qualidade do serviço que está sendo prestado, privilegiando um torcedor em detrimento do outro, não está tendo equilíbrio", explica Ricardo Rezende, advogado e professor de direito consumidor.

No mês passado, o presidente do conselho deliberativo do Athletico-PR, Mario Celso Petraglia, criticou a rede de proteção do setor de visitantes, que ele considerou ser uma "jaula". Apesar disso, segundo a advogada Mônica Sapucaia Machado , especialista em direito político, econômico e especialista em compliance de gênero, a atitude do Palmeiras não pode ser julgada como discriminatória.

"Não são questões de processo discriminatório porque o Palmeiras está construindo uma política de segurança. A lógica da discriminação parte da tentativa de menosprezar um ou outro indivíduo ou grupo de indivíduos. Se fosse uma medida só para torcedores do Internacional… mas não é o caso", esclareceu a advogada.

Mas o torcedor do Internacional que se sentir prejudicado pode, sim, buscar uma reparação por ter sido colocado em um lugar no estádio onde sua visão não era totalmente limpa. "O torcedor poderia reclamar que garantem a ele uma condição diferente da que foi oferecida. Aí pode pedir o dinheiro de volta e pedir indenização, se foi um torcedor que saiu do Rio Grande do Sul, teve custos de deslocamento, todos os demais gastos, eventualmente danos morais, porque ele gastou todo esse dinheiro e não viu o jogo direito", analisa o advogado Ricardo Rezende.

Mas essa medida seria apenas para os poucos que tivessem disposição de buscar reparação na Justiça. Para Ricardo Rezende, a discussão sobre a qualidade da visão no setor de visitante no Allianz Parque tem de ser mais debatida. "Acho que há outras alternativas", acredita o advogado especializado e professor de direito do consumidor. "O ideal seria que pudessem acompanhar, em segurança, a partida. Essa é a única maneira de se evitar o arremesso de objetos? A discussão é qual é a melhor alternativa. O fator segurança é preponderante, mas não pode também deixar o serviço em segundo plano. Imagino que uma segurança reforçada ali resolveria", finalizou Rezende.

Por Thiago Braga

Sobre o autor

Andrei Kampff é jornalista formado pela PUC-RS e advogado pela UFRGS-RS. Pós-graduando em Direito Esportivo e conselheiro do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e criador do portal Lei em Campo. Trabalha com esporte há 25 anos, tendo participado dos principais eventos esportivos do mundo e viajado por 32 países atrás de histórias espetaculares. É autor do livro “#Prass38”.

Sobre o blog

Não existe esporte sem regras. Entendê-las é fundamental para quem vive da prática esportiva, como também para quem comenta ou se encanta com ela. De uma maneira leve, sem perder o conteúdo indispensável, Andrei Kampff irá trazer neste espaço a palavra de especialistas sobre temas relevantes em que direito e esporte tabelam juntos.