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Lei em Campo

Estádio Rei Pelé, que homenageia o atleta do século, pode mudar de nome?

Andrei Kampff

18/08/2019 12h00

Rainha Marta merece todas as homenagens. Com um talento raro, venceu as dificuldades da vida e ganhou o mundo. Seis vezes.

Um fenômeno.

Marta Vieira da Silva nasceu em Dois Riachos, interior de Alagoas. Começou a brilhar pelo CSA para depois decolar em uma carreira que chamou a atenção de todo o planeta.

Heróina em Alagoas. Referência para todos. Orgulho do estado.

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Agora, há uma iniciativa que divide o estado em que ela nasceu: a troca do nome do principal estádio de Alagoas. Um projeto propõe que se dê também o nome ao estádio de Rainha Marta. Ele passaria a se chamar Rei Pelé e Rainha Marta.

O belo estádio é conhecido por todos que acompanham futebol e se chama Rei Pelé (aliás, é o único estádio brasileiro que leva o nome do maior jogador de futebol de todos os tempos). Ele ganhou esse nome antes de uma lei que é importante também nessa análise.

A partir da sanção da Lei Federal 6.454/1977, a prática de denominar bens públicos com nomes de pessoas vivas foi abolida.

Leis nem sempre são justas, mas são leis. No direito, DURA LEX, SED LEX (A lei é dura, mas é lei). 

Portanto, são dois os problemas. O primeiro, retirar uma bela homenagem feita por Alagoas ao principal atleta de futebol de todos os tempo. Outro, a questão legal.

Marta merece todos os carinhos, e a reverência eterna não só de alagoanos, mas também de todos os brasileiros. Mas a questão merece reflexão.

Gustavo Lopes, advogado especializado em direito esportivo e colunista do Lei em Campo, traz a análise dele sobre esse caso.

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Pelé perde homenagem

 

Inaugurado em 1970, o maior estádio de futebol do estado de Alagoas homenageou o maior jogador da história e foi batizado como Rei Pelé, aliás, o único do país que traz o nome dele.

Ocorre que, na bizarra onda lacradora, um projeto de lei que tramita na Assembleia Legislativa de Alagoas pretende alterar o nome do estádio para Rainha Marta, de forma a homenagear a atleta de futebol feminino que é natural do estado.

A alteração exige duas aprovações no plenário da Assembleia Legislativa de Alagoas e a sanção do governador Renan Filho (MDB), pois o estádio pertence ao estado e é dividido pelo clubes CSA e CRB.

Aprovado em primeira votação, após sensatas críticas, na segunda votação houve proposta de emenda para que o estádio passasse a ter dois nomes: Rei Pelé e Rainha Marta.

Vale ressaltar que ao ser indagado sobre a possibilidade de ter seu nome retirado do estádio, Pelé, com a grandeza dos bons, disse que Marta merecia e que a homenagem a ela seria justa.

Inicialmente, imprescindível destacar a vedação legal de denominar prédios públicos com nomes de pessoas vivas.

Isso porque em 1977 foi promulgada a Lei 6.454, que trata especificamente de bens e prédios pertencentes à União Federal, mas que é extendida, por força de simetria, aos estados e municípios.

A Constituição brasileira de 1988 também veda dar nome de pessoas vivas a prédios públicos, uma vez que o art. 37, caput, da Carta Magna brasileira consagrou o Princípio da Impessoalidade na administração pública.

Além disso, retirar homenagens é extremamente deselegante, sobretudo, quando se trata de Pelé,  único atleta tricampeão da Copa do Mundo, que ganhou, ainda, duas Libertadores, dois Mundiais e dezenas de títulos nacionais e estaduais, bem como é aclamado como o atleta do século passado e maior jogador de futebol de todos os tempos.

Eventual homenagem à alagoana Marta, que tem como principais títulos os vices-campeonatos da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos e que, curiosamente, mesmo sem títulos e campanhas de expressão, ganhou por seis anos o troféu de melhor jogadora do mundo de futebol feminino, seria justa, especialmente se tratando da jogadora que é um ícone do hesitante futebol feminino.

A ansia por lacrar e obter notoriedade falando o que as gerações millenials e flocos de neve querem ouvir pode fazer com que um negro perca sua homenagem para uma mulher, em uma aparente hierarquia de importância de "minorias".

Imagine se uma mulher homenageada ao dar nome a um prédio público perdesse a homenagem para renomear o bem com um nome masculino. As redes sociais lacradoras seriam vorazmente alimentadas por textões feministas de empoderamento e vitimização em grau "hard".

Sem dúvidas, Marta merece ser homenageada em seu estado, mas, após sua morte e em um novo prédio público, sem dividir ou retirar a homenagem do Rei de futebol.

#SomosTodosPelé

Sobre o autor

Andrei Kampff é jornalista formado pela PUC-RS e advogado pela UFRGS-RS. Pós-graduando em Direito Esportivo e conselheiro do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e criador do portal Lei em Campo. Trabalha com esporte há 25 anos, tendo participado dos principais eventos esportivos do mundo e viajado por 32 países atrás de histórias espetaculares. É autor do livro “#Prass38”.

Sobre o blog

Não existe esporte sem regras. Entendê-las é fundamental para quem vive da prática esportiva, como também para quem comenta ou se encanta com ela. De uma maneira leve, sem perder o conteúdo indispensável, Andrei Kampff irá trazer neste espaço a palavra de especialistas sobre temas relevantes em que direito e esporte tabelam juntos.