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Lei em Campo

Clubes precisam ceder atletas para seleção. E precisam se unir para mudar

Andrei Kampff

22/09/2019 14h00

A minha opinião é: Tite tem a prerrogativa de convocar o atleta que entender como o melhor para a seleção que ele irá comandar. (Veja bem, contra quem é outra história, e a bronca tem que ser com a CBF que definiu os amistosos – mas se fosse contra a Alemanha tenho certeza de que a irritação seria a mesma).

Mais. Tenho certeza de que quase todas as pessoas no lugar dele também convocariam aqueles que entendem como melhores. Pode apostar.

O calendário e a tal de data FIFA é outra conversa. Não parar o Brasileiro é claro que é um absurdo. Tem que culpar CBF, federações e clubes. Sim, clubes, porque todo final de ano se alerta que no ano seguinte será esse problema, e eles (grande maioria) se calam. Tenho certeza de que, se houvesse um movimento forte dos clubes com relação a isso, a história seria outra.

VEJA TAMBÉM:

O fato é: CBF convoca em datas FIFA, e o clube tem que liberar o jogador.

No Regulamento de Status e Transferências da FIFA, a entidade determina a obrigatoriedade de ceder os atletas. O art. 1 do Anexo 1 diz que "Os clubes são obrigados a liberar seus jogadores registrados para o representante equipes do país para o qual o jogador é elegível para jogar com base em sua nacionalidade se forem convocados pela associação em questão. Qualquer acordo entre um jogador e um clube é contrário".

O artigo em questão é o 207 do Código Brasileiro de Justiça Esportiva, que pune com multa de R$ 100 a R$ 100 mil o clube que se nega a fornecer o atleta para a seleção brasileira. 

Agora, tudo será sempre assim? Talvez não precise ser.

Cada vez mais se cobra que clubes tenham gestão profissional, que respeitem fair play financeiro, que paguem em dia; é fundamental cobrar da entidade organizadora do futebol também uma postura responsável. Portanto, cobrem da CBF para que ela se planeje e se organize sem prejudicar seus filiados em partidas importantes.

Isso até pode ser debatido, desde que os clubes se unam.

Gustavo Lopes, advogado especializado em direito esportivo e colunista do Lei em Campo, escreve sobre essa necessidade.

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Data Fifa: clubes precisam se unir

Com o objetivo de não prejudicar os clubes, que são quem investe na formação dos atletas e paga seus salários, a Fifa estabeleceu um calendário internacional e criou as "datas Fifa".

As "datas Fifa" correspondem ao período em que os clubes são obrigados a liberar seus atletas para a Seleção, e, portanto, as federações devem organizar seus calendários de modo a não prejudicar seus filiados.

A regulamentação da "data Fifa" não aponta expressamente a proibição de partidas de clubes e muito menos punição às federações.

No entanto, a normativa esportiva (Lex Sportiva) deve ser interpretada de forma sistêmica. Ora, a Fifa, entidade maxima do furebol, criou um calendário para não prejudicar os clubes, e as federações têm o dever de se adaptar.

O estatuto da CBF, em um dos incisos do art. 12, estabelece como dever da entidade respeitar e fazer respeitar o calendário internacional elaborado pela Fifa e cumprir as disposições para que a organização de partidas e competições internacionais entre seleções nacionais e entre ligas ou clubes estejam condicionadas a prévia autorização da Fifa.

Em um futebol cada vez mais competitivo e profissional, não há como exigir dos clubes fair play financeiro, pagamento em dia, gestão profissional, se a própria entidade de administração não se planeja e não se organiza e acaba por prejudicar seus filiados em partidas importantes, como no caso do Flamengo.

No momento em que o Flamengo disputa ponto a ponto, rodada a rodada, a liderança do Brasileirão, o clube, que se organizou, é punido por ser profissional e perde um quarto do time para a Seleção disputar amistosos irrelevantes com equipes sem representatividade.

Dessa forma, ou as federações suspendem suas competições nas "datas Fifa" ou adiam as partidas dos clubes que cederem jogadores.

Caso contrário, os prejudicados devem buscar, nos Tribunais Desportivos, o direito de não disputar partidas oficiais nas "datas Fifa". Só assim a organização e profissionalização tão exigidas dos clubes serão, também, realidade nos calendários nacionais.

Sobre o autor

Andrei Kampff é jornalista formado pela PUC-RS e advogado pela UFRGS-RS. Pós-graduando em Direito Esportivo e conselheiro do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e criador do portal Lei em Campo. Trabalha com esporte há 25 anos, tendo participado dos principais eventos esportivos do mundo e viajado por 32 países atrás de histórias espetaculares. É autor do livro “#Prass38”.

Sobre o blog

Não existe esporte sem regras. Entendê-las é fundamental para quem vive da prática esportiva, como também para quem comenta ou se encanta com ela. De uma maneira leve, sem perder o conteúdo indispensável, Andrei Kampff irá trazer neste espaço a palavra de especialistas sobre temas relevantes em que direito e esporte tabelam juntos.