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Lei em Campo

Por que é pouco provável que Ronaldinho vá preso por indícios de pirâmide

Andrei Kampff

11/10/2019 04h00

Nesta semana o UOL Esporte revelou que o Ministério Público Federal (MPF) analisa duas representações contra a 18kRonaldinho, uma empresa que dá indícios de aplicar um golpe conhecido como pirâmide financeira. A empresa costuma apresentar o ex-jogador como sócio-fundador e promete rendimento de até 2% ao dia a clientes que comprarem pacotes que vão de U$S 30 até U$S 12 mil. Os rendimentos seriam supostamente fruto de operações de "trading e arbitragem" na criptomoeda Bitcoin.

"Pirâmide financeira é um problema bem complicado porque ao mesmo tempo não é uma atividade propriamente financeira. Mas, em muitos casos, pode configurar estelionato. A pessoa é induzida a acreditar que vai ter um determinado ganho. Mas não se trata do investimento. É pegar o dinheiro de uma pessoa e repassar para outra como forma de enganar os demais até uma hora em que isso cresce e todo mundo acredita que aquele rendimento realmente é real. E aí é a pessoa e desaparece porque não tem nem dinheiro suficiente pra devolver pra todo mundo", explica o advogado criminalista João Paulo Martinelli.

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Nesse tipo de golpe, o foco maior está em recrutar mais pessoas, ao invés de vender um produto. Porque assim cria-se uma cadeia infinita de pessoas motivadas a atrair mais interessados.

O MP agora investiga a participação de Ronaldinho na fraude. Ao UOL Esporte, o advogado de Ronaldinho afirmou que seu cliente rescindiu o contrato com a empresa há duas semanas. O MP pode indiciar Ronaldinho tanto pela prática de crime contra a economia popular quanto por crime contra o sistema financeiro nacional.

"Um crime contra a economia popular tem pena de até dois anos. É um crime de menor potencial ofensivo. Como a pena é pequena, geralmente a pessoa é condenada a prestação de serviços, interdição de documento, perda de bens e valores, prestação pecuniária. Dificilmente vai presa", esclarece Luciano Santoro, advogado da área criminal.

Mas a situação de Ronaldinho pode piorar se ele for enquadrado na lei 7492, que fala sobre crime contra o sistema financeiro nacional. O artigo 16 prevê reclusão de um a quatro anos, mais multa, para quem "operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante declaração falsa, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de câmbio. Se o MP entender que houve apropriação indébita, a pena pode ser de dois a seis anos de prisão.

"Há indícios de possível prática ou de crime contra a economia popular ou contra o sistema financeiro nacional. Investigação para saber se há a materialidade do crime e saber a autoria. Quem foi que efetivamente praticou [o crime], se ele era um dos autores, ou domínio que ele sabia que essa ação estava sendo realizada. Aí instaura-se uma ação penal, mas ainda é muito prematuro", analisou Luciano Santoro.

Os especialistas acreditam que o ex-jogador vai alegar que não sabia o que a 18kRonaldinho fazia e que apenas emprestou sua imagem para a empresa, livrando-se assim de qualquer vínculo com a empresa.

Na quarta-feira (9) a Câmara dos Deputados aprovou requerimento para que Ronaldinho preste esclarecimentos sobre "indícios de pirâmide financeira em operações da empresa 18kRonaldinho". O requerimento feito pelo deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ) foi lido e aprovado na comissão especial que discute um projeto de lei para regulamentar as moedas virtuais no país.

Com a aprovação, a mesa da comissão vai marcar audiência que deve contar também com representantes do Ministério Público Federal, da Unidade de Inteligência Financeira, da Polícia Federal, da empresa 18kRonaldinho e da Associação Brasileira de Criptomoedas e Blockchain (ABCB). O passo seguinte é a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a atuação dos envolvidos no esquema.

"Se o Ronaldinho for, ele não é obrigado a falar. Ele sequer pode ser ameaçado de prisão se não quiser falar porque ele não tem a obrigação de produzir prova contra si mesmo", finalizou Martinelli.

Por Thiago Braga

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Sobre o autor

Andrei Kampff é jornalista formado pela PUC-RS e advogado pela UFRGS-RS. Pós-graduando em Direito Esportivo e conselheiro do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e criador do portal Lei em Campo. Trabalha com esporte há 25 anos, tendo participado dos principais eventos esportivos do mundo e viajado por 32 países atrás de histórias espetaculares. É autor do livro “#Prass38”.

Sobre o blog

Não existe esporte sem regras. Entendê-las é fundamental para quem vive da prática esportiva, como também para quem comenta ou se encanta com ela. De uma maneira leve, sem perder o conteúdo indispensável, Andrei Kampff irá trazer neste espaço a palavra de especialistas sobre temas relevantes em que direito e esporte tabelam juntos.