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Lei em Campo

Atletas russos podem recorrer a tribunal dos direitos humanos para competir

Andrei Kampff

09/12/2019 20h14

Maxim Shemetov/Reuters

Por unanimidade, a Agência Mundial de Antidoping resolveu suspender a participação da Rússia de todas as competições esportivas no âmbito mundial por quatro anos, impedindo o país de disputar os Jogos de Tóquio, no ano que vem, as Olimpíadas de Inverno, em Pequim, em 2022 e da Copa do Mundo do Catar, também em 2022. A Rússia tem 21 dias para entrar com um recurso no Tribunal Arbitral do Esporte. Mas em caso de o TAS resolver manter a punição da Wada, os russos ainda poderão nutrir esperança para participar das competições esportivas.

"Nada impede que a depender da decisão do TAS, que se possa buscar uma ação no Tribunal Federal Suíço, que é como se fosse o STF. A gente está falando do TAS, uma instância da própria Lex Sportiva, não é estatal, é um tribunal arbitral. E em segunda instância, até porque o próprio TAS reconhece, haveria discussão no Tribunal Federal Suíço. Caberia também discussão na Corte Europeia dos Direitos Humanos. Abrir um processo em cada uma dessas jurisdições. O primeiro passo é recorrer ao TAS", explica o advogado especialista em direito esportivo Wladimyr Camargos.

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Os atletas que comprovarem que não tiveram participação no esquema estatal de doping russo e que estão limpos, vão poder participar das competições individuais sob uma bandeira independente.

"Vejo uma grande possibilidade da gente ter aí um conflito de jurisdição. Me  aí nas edições entre aspas, na verdade. Me preocupa também a situação dos atletas. Os próprios atletas buscarem individualmente, perante outros tribunais que não do sistema esportivo, seu direito de competir no ano que vem", explica o advogado especialista em direitos humanos Vinícius Calixto.

A Rússia entregou os dados de seu laboratório em Moscou em janeiro deste ano, como condição para voltar a participar dos grandes eventos esportivos, após uma suspensão de três anos por ter sido descoberto um programa de doping patrocinado pelo governo russo.

Em setembro, a WADA abriu um procedimento formal de conformidade após a descoberta de "inconsistências" nos dados, dando à Rússia três semanas para explicar. A entrega dos dados do Laboratório de Moscou era parte do acordo que devolveu ao país a condição para participar dos eventos esportivos e estava entre as principais condições para o fim da suspensão da Rusada, mas as promessas não foram cumpridas. E depois foi descoberto que os dados entregues para a agência antidoping foram manipulados, prejudicando as amostras e fazendo com que novos casos de doping baseados nos dados fossem descobertos.

A vice-presidente da WADA, Linda Helleland, disse que a proibição não é suficiente. "Eu queria sanções que não pudessem ser diluídas. Devemos aos atletas limpos implementar as sanções o mais fortemente possível."

Um total de 168 atletas russos competiu sob uma bandeira neutra nos Jogos Olímpicos de Inverno de 2018 em Pyeongchang depois que o país foi banido após os Jogos de 2014, sediados em Sochi. Os atletas russos conquistaram 33 medalhas em Sochi, 13 das quais eram de ouro.

"O que que vai se alegar provavelmente que as entidades esportivas não participaram desse processo de fraude quanto aos dados colocados no sistema de amostras. Vamos ver como que vai reagir o Tribunal Arbitral do Esporte, mas acho que dificilmente vai se voltar atrás quanto a possibilidade de a Rússia competir sobre a bandeira russa nas competições internacionais", analisa o advogado especialista em direito esportivo Jean Nicolau.

A Rússia foi proibida de competir como nação no atletismo desde 2015. Apesar da proibição, a Rússia poderá competir na Euro 2020 – na qual São Petersburgo será uma cidade-sede -, já que a Uefa, órgão que controla o futebol europeu, não é definido como uma 'organização de grandes eventos' no que diz respeito a decisões sobre violações antidoping.

"O problema é que essa decisão acaba sendo um pouquinho incoerente porque ela não afeta competições continentais, como a Eurocopa. Tem todo um interesse comercial e São Petersburgo vai receber jogos da competição. Então ela só se aplica competições de nível mundial", finaliza Jean Nicolau.

Por Thiago Braga

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Sobre o autor

Andrei Kampff é jornalista formado pela PUC-RS e advogado pela UFRGS-RS. Pós-graduando em Direito Esportivo e conselheiro do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e criador do portal Lei em Campo. Trabalha com esporte há 25 anos, tendo participado dos principais eventos esportivos do mundo e viajado por 32 países atrás de histórias espetaculares. É autor do livro “#Prass38”.

Sobre o blog

Não existe esporte sem regras. Entendê-las é fundamental para quem vive da prática esportiva, como também para quem comenta ou se encanta com ela. De uma maneira leve, sem perder o conteúdo indispensável, Andrei Kampff irá trazer neste espaço a palavra de especialistas sobre temas relevantes em que direito e esporte tabelam juntos.