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Quem é atleta profissional no esporte? Dica: essa não é uma pergunta fácil

Andrei Kampff

06/06/2019 18h00

A pergunta parece bem simples. Mas não se engane.

Quem é atleta profissional?

A resposta é importante para definir a situação legal do atleta, até porque a legislação esportiva traz benefícios aos não profissionais, inclusive na Justiça esportiva.

A Lei 9.615/98, a Lei Pelé, determina que é profissional aquele que tem Contrato Especial de Trabalho Desportivo. Acontece que a mesma lei também traz que aos atletas se aplicam as normas da Consolidação das Leis Trabalhistas. Ou seja, a realidade é o que caracteriza a relação de emprego, não um contrato formal.

Então, a melhor resposta poderia ser aquela que diz que o atleta é profissional quando vive do que ganha com o esporte.

Para entender essa discussão importante e qual tem sido o entendimento majoritário dos tribunais, vale ler o que escreveu Vinícius Morrone, advogado especializado em direito esportivo e colunista do Lei em Campo.

 


 

Ser ou não ser, eis a questão. O profissionalismo no âmbito desportivo

 

Uma das discussões que mais geram dúvidas no âmbito da Justiça Desportiva é sobre a definição de atleta profissional. Isso porque existe um artigo no CBJD que garante um enorme benefício aos atletas não profissionais. A discussão ocorre porque o artigo 182 do CBJD garante aos atletas não profissionais e às entidades de prática que participem de competições apenas com atletas não profissionais uma redução de 50% sobre a pena aplicada. No entanto, o próprio código não dispõe sobre o que é ou não atleta profissional.

Dessa forma, algumas correntes surgiram ao longo do tempo buscando sanar essa questão. O primeiro ponto fundamental de toda a discussão é observar que a diferenciação entre esporte profissional e não profissional está presente em nossa Carta Magna, no inciso III do artigo 217. No entanto, mais uma vez, não há definição sobre o que é e o que não é profissionalismo.

Outro diploma legal que aborda o esporte como profissional ou não profissional é a Lei 9.615/98, a conhecida Lei Pelé. Para ela, para que seja reconhecido como profissional o atleta deve ter contrato formal de trabalho com a entidade de prática desportiva, com previsão de remuneração. Diz ainda que o contrato do atleta profissional é especial e deve obedecer a alguns requisitos. A mesma lei, no entanto, também diz que aos atletas profissionais se aplicam as normas trabalhistas gerais e os princípios do direito do trabalho.

Com isso, precisamos observar que o direito do trabalho tem como princípio norteador a primazia da realidade, deixando muitas vezes de lado as definições formais. Isso vai de encontro ao que dispõe a Lei Pelé, uma vez que nesse dispositivo apenas são considerados profissionais os atletas que tiverem contrato especial de trabalho desportivo regularizado. Um trabalhador que tenha a prática esportiva como profissão mas não tenha o contrato especial de trabalho desportivo regularizado, em tese, seria não profissional.

Isso restringia basicamente ao futebol o conceito de atleta profissional, uma vez que, na grande maioria das modalidades, por muito tempo, as disposições sobre o CETD não foram respeitadas. Mais que isso, atletas de modalidades individuais, como atletismo, automobilismo e tênis, que não tivessem contrato com entidade de prática também não seriam considerados profissionais.

Mais recentemente o conceito de atleta ou esportista profissional tem sido ampliado. Todo aquele atleta que tenha o esporte como principal fonte de renda, independentemente da forma como essa renda é obtida (se por meio de patrocínios, contratos de trabalho ou de outra forma), vem sendo considerado profissional. Essa diferença pode ser observada em diversos tribunais esportivos no Brasil, como o da Liga Nacional de Futsal. Até duas temporadas atrás, os atletas de futsal, alguns extremamente bem remunerados, como o Falcão, eram considerados não profissionais e tinham as penas reduzidas pela metade. Nos últimos dois anos, no entanto, mesmo sem cumprir as exigências constantes na Lei Pelé, a realidade da modalidade foi reconhecida pelo tribunal, que não mais aplicou aos atletas o benefício do artigo 182.

Diversos outros tribunais têm firmado esse entendimento, apontando para o reconhecimento da realidade fática em detrimento da realidade formal. Com as diversas decisões, a cada dia mais se aproxima uma definição mais sólida do que é profissionalismo no mercado esportivo.

Sobre o autor

Andrei Kampff é jornalista formado pela PUC-RS e advogado pela UFRGS-RS. Pós-graduando em Direito Esportivo e conselheiro do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e criador do portal Lei em Campo. Trabalha com esporte há 25 anos, tendo participado dos principais eventos esportivos do mundo e viajado por 32 países atrás de histórias espetaculares. É autor do livro “#Prass38”.

Sobre o blog

Não existe esporte sem regras. Entendê-las é fundamental para quem vive da prática esportiva, como também para quem comenta ou se encanta com ela. De uma maneira leve, sem perder o conteúdo indispensável, Andrei Kampff irá trazer neste espaço a palavra de especialistas sobre temas relevantes em que direito e esporte tabelam juntos.