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Conmebol e CBF irão seguir novo código da FIFA que combate racismo

Andrei Kampff

15/07/2019 18h34

Já era hora, finalmente a FIFA toma uma decisão que ataca de frente as manifestações racistas no futebol.

É lugar-comum, até por ser ainda uma grande verdade: futebol é espelho da sociedade. Pro bem e pro absurdo. O racismo existe e é crime. E tem muita gente que não tá nem aí.

Importante antes explicar a diferença entre o crime de racismo e o de injúria racial (é muito comum as pessoas se confundirem).

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E é simples.

Na injúria a ofensa é dirigida a determinado indivíduo de cor ou etnia diferente… É considerada injúria racial a ofensa feita a determinada pessoa com referência à sua raça, etnia, cor, religião ou origem. No ordenamento brasileiro, a injúria racial está prevista no artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal,

O crime de racismo, diferentemente, é discriminação contra um grupo social por causa de sua raça, etnia, cor, religião ou origem. Ele está previsto na Lei n. 7.716/1989, que determina que essa conduta discriminatória é aquela direcionada a determinado grupo. Esse crime é inafiançável e imprescritível, e sua pena é de um a três anos de prisão, mais multa.

Portanto, o que tem se repetido nos estádios no Brasil e no mundo é o crime de injúria racial!

A Europa se vê diante de uma onda de manifestações condenáveis, com vários jogadores negros sendo agredidos. Na Inglaterra, jogadores, técnicos e comunidade esportiva se uniram e promoveram um boicote às redes sociais por 24 horas em protesto contra essa série de insultos.

Mesmo assim, pouco se pune no esporte. Principalmente no Brasil. E já se disse aqui que a legislação esportiva é falha e "alivia" nas punições a esse crime.

Mas agora o novo Código Disciplinar da FIFA traz alterações radiciais que atuam esse problema. E ele vale a partir de hoje. CBF e Conmebol terão que seguir nessa linha.

Entenda com Ivana Negrão, que conversou com especialistas sobre o assunto.

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Novo Código Disciplinar da FIFA com alterações radicais passam a valer hoje. O combate ao racismo em campo deve servir de referência para Conmebol e CBF também.

A FIFA anunciou na última semana seu Novo Código Disciplinar, que começa a valer a partir de hoje. "Essa postura da entidade é uma ação de compliance. Uma resposta institucional a um problema já largamente testemunhado no futebol", comenta Mônica Sapucaia, especialista em direito constitucional e administrativo.

"Tal medida atende os anseios da comunidade esportiva, que precisava de amparo quando denunciava casos de racismo", avalia Vinícius Calixto. Especialista em direito esportivo e causas humanitárias no esporte, Vinícius já escreveu artigo para o Lei em Campo chamando atenção para essa necessidade de apoio e também para os casos em que muitas vítimas de racismo acabaram punidas em campo. Ele lembra do caso do zagueiro do Napoli, Koulibaly, que, em partida ocorrida em março deste ano pelo campeonato italiano, recebeu o segundo cartão e foi expulso ao reclamar com o árbitro sobre as ofensas racistas advindas da arquibancada. Em 2017, o ganês Sunley Muntari também havia sido expulso quando informou ao árbitro sobre os insultos racistas recebidos de torcedores do Cagliari, da Itália. Além de muitos outros casos, inclusive aqui no Brasil.

Sálvio Spinola, ex-árbitro e hoje comentarista de arbitragem da Rede Globo, revela que não só os jogadores são vítimas de atos racistas em campo. "O árbitro Márcio Chagas, do Rio Grande do Sul, já descreveu muitos episódios sofridos por ele. Nessas ocasiões, deu continuidade ao jogo e depois acionou a Justiça Desportiva".

Agora situações como essas podem e devem ser contidas imediatamente, ainda no campo de jogo. Trata-se de uma das principais mudanças do Novo Código de Disciplina da FIFA, que não sofria alterações tão radicais há mais de uma década. A entidade agora atribui muito mais poder ao árbitro durante o jogo, para que ele possa tomar atitudes no chamado campo técnico, como a de determinar o fim da partida se preciso for. 

Para isso, é necessário seguir o chamado "sistema de três passos". Primeiro, a partida deve ser interrompida para que seja feito um anúncio formal contra os atos racistas no sistema de som do estádio. Depois, se o problema persistir, o árbitro deve paralisar o jogo mais uma vez e solicitar um novo comunicado oficial. Por último, a recomendação é o cancelamento do jogo com a saída de todos de campo. O árbitro ainda poderá definir que a equipe infratora, cujos jogadores ou torcedores tenham cometido tais irregularidades, saia como perdedora.

Sálvio lembra que no Brasil a Justiça Desportiva já tem histórico de uma decisão técnica, que foi a de eliminar o Grêmio da Copa do Brasil em 2014, quando torcedores gremistas foram flagrados fazendo gestos e chamando o goleiro Aranha de macaco. No entanto, as novas regras são válidas apenas para os jogos organizados pela FIFA, como as eliminatórias da próxima Copa do Mundo, no Catar. "As demais entidades devem colocar em prática a mesma determinação, seguindo os preceitos da FIFA. Mas ainda não há regulamentação a respeito a nível de Conmebol e CBF", lembra Sálvio Spinola.

"Esse procedimento dos três passos é muito importante. Uma medida que já era urgente para deixar as coisas mais claras para a atuação dos árbitros", avalia Vinícius Calixto, que enaltece outro ponto de alteração no código disciplinar da FIFA. Agora a regra também beneficia o atleta ao permitir que, através de depoimento oral ou escrito, ele possa ser ouvido. "O jogador, vítima de atos discriminatórios pode ser convocado a prestar esclarecimentos. E não só em casos de racismo. A FIFA, inclusive, ampliou o seu espectro em relação aos casos de discriminação, seja por cor de pele, etnia, opção sexual ou de gênero. Assim, as coisas vão evoluir muito a meu ver", acredita Vinícius.

"Essa política institucional dialoga com os valores dos organismos internacionais e aponta o compromisso da entidade com os direitos humanos", defende Mônica Sapucaia. Ela ainda lembra que os objetivos e valores escolhidos pela FIFA devem respeitar as leis dos países onde a entidade atua. No Brasil, racismo é crime e os agentes da conduta racista também serão submetidos às questões legais. A mesma Lei do Racismo (7.716/89), por determinação do Supremo Tribunal de Justiça, agora também pune casos de homofobia aqui no país.

Para Sálvio Spinola, esse é "um golaço da FIFA". Como árbitro, Sálvio já passou por situações em que a torcida fez ofensas a alguns atletas, mas os episódios não tomaram grande proporção e o jogo seguiu. "Hoje, se eu estivesse em campo, pararia o jogo e faria todos os procedimentos até encerrar a partida, se necessário. São atitudes que temos que banir do futebol, do mundo e da sociedade. Chega de racismo". 

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Sobre o autor

Andrei Kampff é jornalista formado pela PUC-RS e advogado pela UFRGS-RS. Pós-graduando em Direito Esportivo e conselheiro do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e criador do portal Lei em Campo. Trabalha com esporte há 25 anos, tendo participado dos principais eventos esportivos do mundo e viajado por 32 países atrás de histórias espetaculares. É autor do livro “#Prass38”.

Sobre o blog

Não existe esporte sem regras. Entendê-las é fundamental para quem vive da prática esportiva, como também para quem comenta ou se encanta com ela. De uma maneira leve, sem perder o conteúdo indispensável, Andrei Kampff irá trazer neste espaço a palavra de especialistas sobre temas relevantes em que direito e esporte tabelam juntos.


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