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Feriado não acalma Chile e assusta Conmebol por final da Libertadores

Andrei Kampff

01/11/2019 19h57

A possibilidade da final da Taça Libertadores ser disputada longe de Santiago ainda existe, muito embora a Conmebol siga torcendo para que tudo se acalme no Chile, e não tenha que mudar de sede.  Segundo o jornalista brasileiro Cauan Biscaia, que trabalha no país há oito anos e está acompanhando a crise de perto, a situação não melhorou.  Ele relata que o clima segue tenso, e protestos continuam. Santiago está um caos.

Segundo apurou o blog,  a Conmebol e o governo sequer apostam, mas apenas têm esperanças de que esse feriado prolongado, que começou na quinta-feira, apague os incêndios das ruas e esfrie a mobilização dos manifestantes.  Acontece que na quinta a negociação entre governo e oposição não avançou, já que os partidos de oposição exigiram uma nova Constituição,  algo que o governo não aceita discutir. Para complicar ainda mais, nesta sexta foram registradas manifestações com milhares de pessoas pedindo a renúncia de Sebastian Piñera em vários cantos do país. As pessoas não viajaram para protestar. 

,Membros da Conmebol estão assustados com esse fogo que insiste em não apagar.

Como o Lei em Campo no UOL  antecipou ao longo da última semana, algumas alternativas de troca de sede foram apresentadas. Inclusive com dois jogos, no Brasil e na Argentina – mas regulamento impede essa possibilidade como mostrado aqui na semana passada. Hoje, o Plano B está pronto e seria Paraguai. Mas a Conmebol vai esperar até o último momento possível para trocar o local da decisão, pois a entidade não quer ter que, pelo segundo ano consecutivo, disputar o jogo fora do local previamente planejado.

E é preciso explicar os motivos. Muita gente já tem ingresso e passagem compradas para a final em Santiago. Os patrocinadores têm ações de marketing montadas para essa decisão. São muitas as consequências jurídicas dessa troca.

Como ficam os torcedores do Flamengo que já compraram passagens e reservaram hotel, por exemplo?

"Há uma relação mais tênue neste caso do que em relação aos prestadores diretos de serviço, como hotéis, companhias aéreas e empresas de turismo. Mas o Procon irá ajudar os consumidores que o procurarem contra a Conmebol. O consumidor é a parte vulnerável na relação", explicou Fernando Capez, que é o diretor-executivo do Procon-SP.

Para o consultor de marketing Amir Somoggi, o problema é estrutural. "O pouco respeito ao torcedor, ao consumidor, é o grande problema de gestão da América do Sul, e vale para o Brasil também. Do ponto de vista econômico, é um prejuízo", disparou Somoggi.

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Quase certo é que quem comprou ingressos e já pagou o traslado do Brasil para o Chile tem sim o direito a ter o valor gasto de volta, mas segundo o advogado especialista em compliance Nilo Patussi, não deve ser a Conmebol que ficará com esse prejuízo específico.

"Clientes que compraram pacotes para a final tem sim direito de reembolsos, mas com a agência. Mas as agências normalmente já trabalham com seguro para isso, são chamados de seguros any reason", afirma Nilo.

A Conmebol vem trabalhando desde a semana passada com a possibilidade de levar a final da Libertadores para outro local. O Chile vive um cataclisma social, e as ruas estão incendiando. Uma das ideias é de que a final pudesse voltar a ser disputada, extraordinariamente, em duas partidas, na Argentina e no Brasil. Mas essa discussão foi travada pelo próprio regulamento da competição.

"O regulamento da Libertadores concede à Conmebol poderes suficientes para determinar a mudança do local da final para qualquer outra cidade que ofereça segurança a todos os envolvidos. Contudo, não há no regulamento a possibilidade de realização de uma final em sistema de ida e volta. Adotar uma medida desta natureza seria mudar o formato da competição, o que não pode ser feito neste momento", analisa o advogado Eduardo Carlezzo.

O presidente do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo, Luiz Marcondes, acredita que o maior prejudicado "é o povo chileno", que perder a oportunidade de sediar uma partida deste porte. Mas ele adverte que os patrocinadores podem acionar a Conmebol. "Sempre há consequências financeiras. Então é natural que haja sim um prejuízo para a própria entidade. A Conmebol pode ser acionada pelos patrocinadores. Inclusive eles podem buscar perdas e danos, mas eu não acredito que isso aconteça", afirma Marcondes.

O banco Santander e a operadora de cartões de crédito Mastercard negociaram entre 30 de agosto e 6 de setembro exclusivamente a seus clientes o primeiro lote de ingressos para a final. Estima-se que ao menos 2 mil bilhetes foram vendidos a clientes com cartão Mastercard emitidos pelo Santander do Chile.

"Se tiver patrocinadores locais que só se interessavam com a partida ser disputada em Santiago, a Conmebol vai ter que reparar ou então ver como dispõe o contrato. Em muitos contratos tem cláusula de casos de força maior", adverte Paulo Feuz, presidente da Comissão de Direito Desportivo da OAB/SP.

O advogado especialista em direito esportivo Marcos Motta não crê que a Conmebol seja condenada a ressarcir prejuízos por conta da possível mudança de local da final.

"Os motivos [para a mudança de local] não são relacionados diretamente com a Conmebol. Nada seria feito sem anuência dos patrocinadores. Todos estão no mesmo barco", resumiu Motta.

Nesta semana o governo chileno deu um passo que aumentou a especulação sobre a mudança de local da final da Libertadores ao determinar o cancelamento da cúpula da Apec, a Cooperação Econômica Ásia-Pacífico e a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP 25. Ambos os eventos estavam marcados para acontecer poucas semanas antes da final entre Flamengo e River, marcada para dia 23 de novembro.

O consultor de marketing Fernando Ferreira resgata os incidentes do ano passado, quando torcedores do River Plate atacaram o ônibus do Boca Juniors minutos antes da partida decisiva da competição. Depois de uma longa novela, a final da Libertadores foi levada para Madri. "É o segundo ano seguido, obviamente afeta a imagem", diz Fernando.

"É um prejuízo de imagem, de credibilidade que já não é o forte da Conmebol. O segundo campeonato seguido que você não consegue estruturar uma final. Um negócio, um negócio inédito. Por mais que de novo seja por elementos de força maior. Mas aconteceu. O fato é que aconteceu com a final da Libertadores. Então o prejuízo principal é o da governança do campeonato. É um prejuízo intangível sobre a imagem da Conmebol", finalizou Fernando Ferreira.

Com Thiago Braga

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Sobre o autor

Andrei Kampff é jornalista formado pela PUC-RS e advogado pela UFRGS-RS. Pós-graduando em Direito Esportivo e conselheiro do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e criador do portal Lei em Campo. Trabalha com esporte há 25 anos, tendo participado dos principais eventos esportivos do mundo e viajado por 32 países atrás de histórias espetaculares. É autor do livro “#Prass38”.

Sobre o blog

Não existe esporte sem regras. Entendê-las é fundamental para quem vive da prática esportiva, como também para quem comenta ou se encanta com ela. De uma maneira leve, sem perder o conteúdo indispensável, Andrei Kampff irá trazer neste espaço a palavra de especialistas sobre temas relevantes em que direito e esporte tabelam juntos.