Regulamento prevê troca de local da final da Libertadores. Entenda a crise
Andrei Kampff
25/10/2019 14h00
A situação no Chile segue grave. E ela afeta o esporte.
As manifestações nas ruas nas principais cidades do país ganharam maior participação popular, apesar da agenda com propostas sociais anunciadas pelo presidente conservador Sebastian Piñera. Santiago parou nesta quinta-feira, e segundo as autoridades, houve 68 concentrações em todo o país, reunindo quase meio milhão de pessoas.
Pessoas que moram por lá, e com quem conversei, relatam dias de tensão, com momentos que remetem a uma guerra civil. E todos reforçam que ela não tem como cerne o aumento de 30 pesos chilenos (0,17 reais). O Chile incendiou por causas muito mais profundas e sérias. Uma catástrofe civil que está relacionada, principalmente, à permanente desigualdade social que atinge muitos países do mundo, e todos da América do Sul.
Ricos ficando mais ricos. Pobres perdendo direitos, e se conscientizando de que os degraus da sonhada escalada social aumentaram.
Mesmo assim, governo tenta levar mensagem de confiança.
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O governo tratou de confirmar a realização da cúpula do Fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (APEC), marcada para novembro, e da Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (COP25), que será em dezembro, ambas em Santiago, O mesmo vale para a final da Libertadores entre Flamengo e River.
A Conmebol se pronunciou dizendo que "a data, local e horário inicialmente estipulado" estão mantidos para a realização da primeira final em partida única na que acontecerá no Estádio Nacional, mas – ATENÇÃO – ela levará em conta a "segurança dos clubes, jogadores, torcedores e meios de comunicação credenciados, para que o único protagonista seja o futebol sul-americano".
É preciso entender o que não irá aparecer – claro – no discurso oficial.
A entidade está com medo. E calejada. A Copa Sul-americana mudou de local por causa da crise social que passa o Perú. Jogos da Libertadores Feminina foram adiados – e a competição correu risco de não sair – por conta dos protesto no Equador.
Tudo que a Conmebol não quer é um evento em lugar conturbado politicamente.
Como tem que ser, ela estuda e trabalha com todas as possibilidades.
Por isso, ela trabalha com a final no Chile, torcendo para que tudo se acerte até o final desse mês. Mesmo assim já estuda alternativas (claro que não irá admitir publicamente isso ainda). Inclusive o departamento jurídico analisa desdobramentos legais dessa troca de local. Acho que Uruguai e Paraguai seriam as alternativas mais seguras.
Os próximos dias serão decisivos para saber qual será a resposta popular. A cada dia com tumulto, a cada novo incêndio no Chile, cresce a chance de Santiago perder também a final da Libertadores.
Entenda o que diz o regulamento da Libertadores sobre a troca de local com Luiz Marcondes, presidente do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e colunista do Lei em Campo.
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Afinal, onde será a final?
A maior competição sul-americana de futebol já tem os finalistas da edição 2019 e voltará a observar um duelo entre Brasil e Argentina. O Flamengo, representante brasileiro, credenciou-se para a última partida após vencer o Grêmio, e o River confirmou sua participação em mais uma final após vencer o também argentino Boca Juniors.
Pela primeira vez na história do torneio a final será em partida única e jogo derradeiro não acontecerá em um dos países dos times finalistas. Assim como ocorre nas principais competições continentais europeias, o campeão será definido em uma partida em um estádio predefinido, conforme dispõe o regulamento da Copa. A mudança foi decidida pela CONMEBOL por conta dos episódios de violência e de falta de segurança e organização ocorridos em 2018, quando o último jogo entre River e Boca teve de ser realizado em Madri, na Espanha, após muitos problemas.
A previsão é de que a partida deste ano seja disputada em 23 de novembro, um sábado, em Santiago do Chile. Entretanto, o Chile não vive um bom momento político. Protestos marcaram o início da semana passada, por conta do aumento do preço da passagem do metrô em Santiago. Houve morte e muitos feridos seguem hospitalizadas, de acordo com informações do Ministério da Saúde.
A Conmebol manifestou a sua intenção de manter a final da Taça Libertadores da América em Santiago, mesmo após os fatos violentos dos últimos dias na capital do Chile por protestos de cidadãos contra a desigualdade no país.
Em um comunicado, a instituição enfatizou que "a data, local e horário inicialmente estipulado" estão mantidos para a realização da primeira final em partida única na que acontecerá no Estádio Nacional, mas levará em conta a "segurança dos clubes, jogadores, torcedores e meios de comunicação credenciados, para que o único protagonista seja o futebol sul-americano".
Ainda que a intenção seja manter a decisão na capital chilena, o contato com as autoridades do país e com todos os responsáveis pela realização da partida é constante, pois há a previsão da troca do local em caso de necessidade nos regulamentos editados pela CONMEBOL. O regulamento da competição dispõe:
"Art. 26 A FINAL da CONMEBOL Libertadores 2019 será disputada pelos
times vencedores das duas Semifinais. Os times disputarão uma partida
única pelo título de campeão do torneio de referência em uma sede
predefinida pela CONMEBOL. (…)
§3º – A organização da partida final é de responsabilidade da CONMEBOL. (…)"1
O Diário Olé, da Argentina, citou que a Conmebol já começou a buscar um plano B caso a situação se mantenha e a final não possa acontecer com segurança no Chile.
Torcemos para que os torcedores de Flamengo e River possam torcer em paz para os seus times em um grande jogo no Chile, em Santiago e não no Santiago, o Bernabeu, estádio do Real Madri da Espanha, palco da finalíssima de 2018, que apontou os holofotes para as dificuldades sulamericanas de administrar grandes crises e colocou em perigo o pleito de Argentina, Paraguai e Uruguai de sediarem a Copa de 2030.
"Cree em grande", CONMEBOL!
1 – REGULAMENTO
CONMEBOL
LIBERTADORES – edição 2019
Sobre o autor
Andrei Kampff é jornalista formado pela PUC-RS e advogado pela UFRGS-RS. Pós-graduando em Direito Esportivo e conselheiro do Instituto Iberoamericano de Direito Desportivo e criador do portal Lei em Campo. Trabalha com esporte há 25 anos, tendo participado dos principais eventos esportivos do mundo e viajado por 32 países atrás de histórias espetaculares. É autor do livro “#Prass38”.
Sobre o blog
Não existe esporte sem regras. Entendê-las é fundamental para quem vive da prática esportiva, como também para quem comenta ou se encanta com ela. De uma maneira leve, sem perder o conteúdo indispensável, Andrei Kampff irá trazer neste espaço a palavra de especialistas sobre temas relevantes em que direito e esporte tabelam juntos.